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POOLS: um terror relaxante

Seja água.

Escape por uma pequena abertura na trama da realidade e você logo estará nas backrooms, um conjunto infinito de salas e corredores organizados em múltiplas configurações. Nos níveis inferiores, é possível encontrar piscinas e espaços liminares tomados por uma água morna e cristalina, com propriedades relaxantes capazes de curar o corpo e a mente. A estranha arquitetura sugere que esse lugar foi varrido para debaixo do tapete durante a construção do mundo, como um projeto abandonado pela metade em uma prancheta. Há enormes escadarias que levam a lugar nenhum e luzes tão brilhantes que a energia correndo por elas preenche o ar com um zumbido grave. Por todos os lados a água se infiltra e descansa no espaço entre os espaços, ondulando ligeiramente para acomodar a passagem de raros, mas eventuais visitantes. POOLS

Caminhar pelo azulejo frio traz uma sensação de tranquilidade. A lente olho de peixe filtra o mundo ao redor e comprime a imagem através da câmera VHS, curvando ligeiramente a luz em linhas vermelhas e azuis na silhueta do mundo visível. Estar aqui é como sonhar um sonho inofensivo, do qual o sonhador tenta mas não consegue escapar, enredado pela profusão de caminhos com que é forçado a sonhar.

A solidão é esmagadora contra o vazio das galerias imensas, dos salões alagados até a cintura, desse mundo que se parece muito com um clube de natação em reforma ou um arquipélago interditado de piscinas públicas, mas também com um pesadelo cuja estranheza só se compara aos mais excêntricos contos de natureza onírica. Em uma vasta piscina, patos de borracha boiam sorridentes à deriva na solidão azul, alheios ao olhar dos visitantes. Escadarias despontam para dentro e para fora da água, às vezes sem explicação plausível, e uma incalculável rede de tobogãs perpassa o cenário, atravessando as paredes e frequentemente encaminhando os visitantes a lugar algum. POOLS

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Explorar as poolrooms pode ser uma experiência tranquila, mas também desafiadora. Não é fácil descobrir o caminho para fora das piscinas, escondido entre dezenas de cômodos, corredores submersos e passagens azulejadas que se confundem no ambiente. Ficar perdido é parte integral do processo, e não raramente a desatenção (ou mero azar estatístico) pode transformar uma longa caminhada de 20 minutos em um retorno ao ponto de origem.

O trânsito pelas piscinas certamente parecerá caótico aos marinheiros de primeira viagem. Com suas entranhas interconectadas, esse labirinto com cheiro de cloro se retorce em uma confusão de azulejos, padrões arquitetônicos e água levemente salgada. Basta um minuto de distração, uma esquina virada errada, para que se desfaça qualquer senso de direção. Escadarias escherianas e torres da largura de prédios se avolumam no coração das piscinas, corredores estreitos levam a mais corredores estreitos – e dizem que estranhas obras de arte podem ser encontradas algures. Não há muito o que se fazer por aqui além de caminhar, observar e registrar, é verdade; mas a exploração é por si só a maior recompensa deste passeio. POOLS

Lá embaixo, nos níveis úmidos e inferiores das backrooms, não há ninguém além do viajante solitário que vez por outra desembarca por acidente. Nenhum monstro ou criatura nas sombras para perseguir os desavisados, nenhum tipo de desafio real além do mais real dos desafios: ser uma boa companhia para si mesmo, enfrentar a solidão e achar uma forma de seguir em frente. A paranoia, entretanto, é real – e muitas vezes justificada por certos eventos que se articulam inexplicáveis pelo cenário à volta, reforçando a expectativa de que algo pode acontecer a qualquer momento, de que alguém nos espia da escuridão. Como um interruptor, a lógica dos cenários regula as emoções de quem navega por eles, ora despertando medo e incômodo com seus locais de passagem desertos e áreas comuns desabitadas, ora reconfortando pelo prazer infantil de permitir aos visitantes escorregar de bunda para dentro da água. Não existem mapas além daqueles que se organizam mentalmente, nenhum obstáculo que não nosso próprio conhecimento, e encontrar a saída é o mais próximo que alguém poderia, ao transitar pelos bastidores da realidade, chamar de objetivo.

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Para escapar das piscinas, porém, é necessário mais do que boa memória e orientação espacial: é preciso ter sorte. Sorte para, naquela passagem bifurcada, escolher a direita certa ao invés da esquerda errada; para farejar o ar e localizar a saída mesmo no negrume de um porão inundado; para descer pelo tobogã vermelho, que leva a um local seguro, em vez do tobogã amarelo, que desemboca em um lugar terrível (ou seria o contrário)?

O visitante pode se sentir tentado, também, a estabelecer suas próprias estratégias de navegação – como pegar todas as saídas à direita por certo período de tempo e depois todas as saídas à esquerda no momento seguinte –, e até mesmo se beneficiar da extravagância e completa falta de sentido de algumas delas, como se deslocar em ziguezague pelas salas até encontrar, pelo mais absoluto acaso, a saída que procurava.

Vale aqui a recomendação do gato de Cheshire para Alice: se você não sabe para onde vai, tanto faz o caminho que tome. Entrar pela porta iluminada pode ser mais tentador do que atravessar este umbral emoldurando a escuridão, mas contrariar seus instintos – tanto quanto segui-los – é muitas vezes o melhor caminho para escapar das piscinas e retornar à ilusão do mundo real, cabendo ao visitante escolher a estratégia que melhor se adapta ao seu estilo de exploração.

POOLS: UMA ASSOMBROSA REALIZAÇÃO

Quem volta das piscinas volta de lá diferente, com um brilho no olhar, falando sobre estátuas que se movem sozinhas e portas abertas para outros mundos, a melhor experiência do ano, ainda que, como sabemos, nem todo mundo realmente consiga voltar. Para aqueles que retornam das piscinas, no entanto, o sentimento não pode ser outro que não de completa satisfação e assombro. Pela imponência do cenário, pelo impacto da jornada – pela caminhada sem igual através desse hipnótico e complexo labirinto de azulejo e água.

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As piscinas seguem abertas para visitação desde abril de 2024, oferecendo aquilo que o Instituto Antropogamer classificou como “um terror relaxante”. POOLS

Para embarcar nessa viagem, compre seu ingresso aqui.

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